Xadrez com pombos
Texto de outras redes, mas que achei válido trazer revisado pra cá. :)
Em algumas discussões, você não sente que está jogando xadrez com pombos?
Você entrega uma informação, uma única informação, e nós, animais que somos, em vez de argumentarmos apenas em cima da informação dada, jogamos outras informações, em sua maioria conclusões dedutivas precipitadas, como se isso pudesse de alguma forma ajudar no debate, quando, na verdade, apenas atrapalha.
Às vezes, me pego em discussões em que a informação dada lá no início já nem é lembrada, já se perdeu há muito, porque as informações novas já invadiram a dança completamente, como ciscadas de pombos hipnóticas. E essas informações novas até podem ser hipóteses para o argumento da discussão. O problema é que falamos com convicção de uma verdade única, o que destrói e contamina a discussão – e, por consequência, a riqueza do debate.
Sou dessas que preferem a pergunta à resposta. Perguntas me ajudam a refletir sobre o tema, sobre tudo que o permeia. É claro que as respostas me invadem com convicção e a razão me diz que estou certa e dá vontade de todo modo mostrar isso, mas eu também sou teimosa e questiono essas convicções, verdades e conclusões o tempo todo, senão, eu sei que vou cair numa armadilha e estragar uma boa discussão.
É difícil encontrar pessoas que saibam entrar numa boa discussão. Muitos querem impor sua visão e não estão dispostos nem preparados para ouvir o outro lado.
No livro Story, de Robert McKee, o autor fala da dualidade dos personagens e das cargas positivas e negativas que colocamos neles e nas histórias. E que mesmo na dualidade ‘amor x ódio’ por exemplo, não existem apenas esses dois valores. Você tem também a indiferença, o ódio de si e como eles se conectam ou se afastam dependendo da transformação do personagem. Há muitas camadas nos valores e, por consequência, na visão de mundo, nas opiniões e nas discussões. Tudo é muito cinza, nunca preto no branco.
Se você entra numa discussão já sabendo a resposta, é muito provável que você não consiga enxergar esses outros valores contraditórios e contrários, e muito possivelmente não haverá troca, nem debate e é capaz de você sair do papo bem irritado ou no mínimo com menos vontade de discutir do que antes, o que também é contraproducente para você e para o próximo.
Precisamos uns dos outros para avançar, evoluir e aprender cada vez mais. Isso devia ser óbvio.
A gente sempre vai buscar ter razão, por n questões psicológicas, que agora não cabe falar; o desafiador é combater isso numa discussão. Ainda mais numa discussão que foi proposta por um amigo, um conhecido, um familiar... ou mesmo um desconhecido.
Por que o ataque? Vamos prestar atenção nas nossas respostas impulsivas? Analisar por que algo nos incomoda, por que uma pergunta nos fere, por que um apontamento é tão perturbador e opressor? Dói fisicamente quando alguém discorda da gente?
Uma hipótese que surgiu na infância e sigo comprovando dia após dia é que, quando algo ou alguém nos incomoda muito, isso diz muito mais sobre nós do que sobre a pessoa ou esse algo. Então, em vez de ficar dando voltas ciscando, por que não tentar entender a primeira linha da equação antes de querer resolver o X da questão? Às vezes, vejo pessoas entrando com fúria num debate sem sequer terem entendido a pergunta.
Talvez eu esteja dizendo isso tudo porque nunca fui uma pessoa de finais. Não dou tanto valor assim a eles, apesar de adorar e me comover com um bom final. A ideia da jornada, de tudo o que é vivido, pra mim é muito mais importante.
A discussão, o debate, a conversa pode ser uma jornada prazerosa, com ideias, contraideias, hipóteses, exemplos, não uma disputa de quebra de braço. É um dueto e não um duelo. E a dedução apressada pode ser a pior inimiga do debate.
É só uma ideia. E talvez eu só esteja falando sobre isso por não ter conseguido me expressar numa discussão e agora esteja colocando a culpa na praga dos pombos-humanos…
Quem sabe?
Ainda assim, a reflexão é sempre válida.